sábado, 30 de abril de 2011

Porta retratos

Uma cidade é como os seus habitantes a vivem e também aquilo que eles constroem. Nas cidades da Costa do Cacau eles viviam de gravata ou de manga comprida. O primeiro era o símbolo da riqueza, o segundo o do trabalho árduo, embaixo do sol. Hoje, os personagens se diversificaram.


(Para começar o dia, ou para relaxar, ou para terminar. O surf faz parte das praias de Itacaré e é muito procurada por isso)


(No lombo do burro, o homem carregava dois tonéis de água que ele tinha ido longe buscar)


(Bem cedinho, às 5 da manhã, os jangadeiros saem da praia de Serra Grande para buscar peixes a perder de vista. Eles só voltam às 5 da tarde. Dizem que no verão o mar se enche deles e forma uma paisagem linda do mirante lá de cima)


(E tem também outros "barqueiros" que passeiam pelas pelas praias baianas)


(Parte da cultura contida em uma roda de capoeira)

terça-feira, 26 de abril de 2011

O que vale a pena em Ilhéus

"E, de repente, o avião se desviou da rota pa ra o sul, e a cidade apareceu ante os olhos dos viajantes. Agora não voavam mais sobre o mar verde. Primeiro foram os coqueiros e logo depois o morro da Conquista. O piloto inclinava o avião e os passageiros que iam do lado esquerdo podiam ver, como num postal, a cidade de Ilhéus se movimentando"

Assim começa o livro São Jorge de Ilhéus, publicado em 1944 por um dos maiores escritores brasileiros, saudoso Jorge Amado. Através de diálogos interessantes e uma descriçãodetalhada da região, o autor narra as conquistas da terra no sul da Bahia em uma época que o cultivo do cacau era a fonte, de renda e mazelas, do estado.

Independente das questões culturais e humanas - que são muitas - Jorge Amado descreve uma Ilhéus cheia de encantos, mesmo quando a pobreza toma conta do cenário. Na sua forma de escrever fica visível uma fascinação pela cidade.

Hoje, é difícil encontrar a Ilhéus de Jorge Amado. Por vezes, reconheço algumas paisagens e lugares. Mas só. O principal problema não é encontrar a rua x ou a praia y. O mais difícil é encontrar seu ponto de vida. Mas sim, Ilhéus ainda tem belas paisagens para quem vem de longe. A principal a gente encontra no centro, no entorno da rua Coronel Paiva.

(Catedral de São Sebastião. Uma das poucas no Brasil que mal couberam na foto)

Ali fica a Catedral de São Sebastião, uma bela e imponente igreja que começou a ser construída no ano de 1931. Do lado de fora ela é suntuosa, traz pilares, abobadas e detalhes em estilo neoclassico. Do lado de dentro o oposto: a igreja é super singela. As obras da catedral só terminaram em 1967. Na contramão da maior parte dos monumentos da cidade, ela passou por uma grande reforma em julho de 2010 e está muito bem conservada.

Ao lado está o bar Vesúvio, um dos cenários mais importantes de Gabriela, Cravo e Canela, outro romance de Jorge Amado que traz Ilhéus como pano de fundo. O bar foi construído entre os anos de 1919 e 1920. O local já foi ponto de encontro dos intelectuais baianos. Hoje, é um bar comum, que vive do turismo proporcionado pelo escritor baiano já que é pouco apreciado pelos moradores da região (inclusive pelo preço).

(O Bar Vesúvio traz uma estátua do Jorge Amado admirando a catedral)

Numa das ruas paralelas, próximo ao porto, está outro bar famoso. O Bataclan era um cabaré famoso - igualmente citada nos livros de Jorge Amado - que teve seu apogeu entre os anos de 1926 e 1932. Era frequentados pelos magnastas locais e já foi palco de grupos de dança nacionais e até internacionais, como argentinos e franceses. Além da sala, o cabaré funcionava também como cassino e bordel. Com a lei que proibia os cassinos no país, porém o Bataclan declinou. Hoje, reformado, o cabaré é um cyber-café agradável, com espaço para exposições culturais e lançamentos de livros.

Além desses monumentos, algumas belezuras naturais também merecem uma visita. Uma delas é o Rio do Engenho. Algumas agências de turismo organizam passeio de barco pelo rio que corta a cidade. Além das belas paisagens "aquáticas" ali perto está o povoado do Rio do Engenho, que data de antes de 1550. O povoado foi tombado pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional por trazer, entre outros, ruínas da fazenda de Santana, uma das primeiras do país.


(Não precisa nem dizer que durante o nascer ou o pôr do sol o passeio é ainda mais agradavel. Foto tirada desse link)

Para curtir uma prainha và as praias do norte, na rodovia entre Ilhéus e Itacaré. Tem um conjunto de 8 praias pouco frequentadas pelos turistas sendo que algumas delas nem pertencem a Ilhéu smais.

sábado, 23 de abril de 2011

Quando olhar incomoda

As ruas de pedrinhas, perto do aeroporto, anunciavam uma cidade ao menos charmosa. Era só ilusão. A cada esquina que o carro dobrava via-se prédios com pinturas descascadas e cerâmicas caindo do céu. As casas se amontoavam: paredes coladas, puxadinhos de todos os lados, tijolos a vista. As plantas nos canteiros centrais e nos jardins particulares - com algumas exceções - muito mal cuidadas. Dos postes, fios e mais fios saíam de todos os lugares. Antes que algum detalhe prenda sua atenção, não se engane. Turista: Ilhéus é um erro.


(Cabaré Bataclan, imortalizado nos livros de Jorge Amado. Tentei de todas as formas tirar uma foto sem pegar os fios elétricos. Não deu)

Durante a semana que passei na Costa do Cacau, dormi na cidade todos os dias. Respirava sua maresia e apreciava suas paisagens da janela da minha pousada na beira da Praia da Avenida. Sempre que ia a outro município passava no centro da cidade e via sua ruas, sua população e todos os seus hábitos. Era sempre um alívio sair dali.

O descaso da população, e principalmente do governo, é visível. A impressão que dá é que não há plano diretor ou leis sobre a construção de imóveis. Seja no centro ou nas rodovias que levam às praias, a cidade é uma grande bagunça. Olhar incomoda.

Na hora errada

Antes da vassoura-de-bruxa infestar as plantações da região, Ilhéus foi a cidade com a maior produção de cacau do mundo. Rica e bem desenvolvida, era conhecida como a "Princesinha do Sul". Quem morava ali tinha dinheiro e classe. Os fazendeiros eram cultos e seus filhos iam estudar nos grandes centros urbanos do Brasil ou mesmo no exterior. No convento e igreja Nossa Senhora da Piedade vi algumas fotos dessa época. A cidade era belíssima! Tinha praças largas, jardins bem cuidados e construções organizadas.


(Nesse site, uma ideia da Ilhéus dos anos 1950)

Ilhéus ainda é relativamente rica. Possui o 6º maior PIB do estado da Bahia, com uma economia baseada em turismo, agricultura e indústria. Mas a cidade que eu vi está a anos-luz de distância daquela que Jorge Amado relata nos livros Terras do Sem-fim, São Jorge de Ilhéus e o famoso Gabriela, Cravo e Canela. A Ilhéus pela qual ele se apaixonou era aquela que vi nas fotos em preto em branco, nas paredes do convento.

O que sobra

Mas algo de interessante Ilhéus deve ter para que o turismo seja uma de suas fontes de renda. Sim. Não é preciso tirá-la do roteiro, mas algumas pontos devem ser destacados:

Regra nº 1: não se hospede no centro

Tudo o que disse sobre Ilhéus se restringe ao centro da cidade, aquela parte cheia de comércio e movimento. O problema é que é que Ilhéus toda parece um grande centro. Não há bairros residenciais bonitos ou uma região histórica separada. Assim, a solução é se hospedar nas praias afastadas da área urbana.


(Mesmo as praias urbanas podem dar belos visuais. O mesmo acontece com os monumentos, como a Igreja Matriz de São Jorge dos Ilhéus. Quando bem cuidadas, são um colírio para os olhos)

Regra nº2: cuidado com as fotos

Um dos motivos que nos fazem escolher uma cidade como roteiro turístico potencial é as imagens do lugar. A internet está cheia de belas imagens, como no site Brasilhéus e Férias Brasil. Mas todos sabem que hoje até o Microsoft Office é capaz de corrigir imperfeições. Não peço incredulidade total, mas um pouco de noção (o que nos leva para a 3ª regra, algo a ser seguida em TODAS as viagens)

Regra nº3: não espere demais

A maior parte das pessoas cai em duas armadilhas. Uma delas é esperar a Ilhéus dos anos 50. Atenção, ela não existe. A outra é se encantar com os relatos de quem foi para ficar em algum resort. Eu cai nas duas, principalmente na segunda. Tenho amigos que já foram para a cidade e voltaram contando maravilhas. Hotéis cinco estrelas são sempre hotéis cinco estrelas: é difícil dar errado.

terça-feira, 19 de abril de 2011

A melhor escolha da Costa do Cacau

Há um grande motivo para Itacaré ser um dos destinos preferidos de quem viaja à Bahia: paz, sossego e tranquilidade. A cidade ainda não foi tomada pelos turistas e seu clima praiano, principalmente na baixa temporada, atinge os níveis mais satisfatórios do litoral.


(Ta vendo algum ser vivo ali embaixo? Não? Exatamente...)

Dizer que ela não foi "tomada" pelos turistas não quer dizer que eles não estejam lá. E o ano todo. Por ser um destino nacional e internacional, há estrangeiros pra todo lado, e em todas as praias. Entre abril e junho e setembro e novembro eles se tornam 50% desse público, já que no Brasil não há ferias e, menos ainda, a cultura de se viajar sempre que a oportunidade aparece.

Mas a cidade também não é um marrasmo completo. Para um local receber uma boa quantidade de turistas ele precisa oferecer infraestrutura básica: hotéis, pousadas, restauranntes, comércio, estradas de acesso, etc. A grande sacada da cidade é oferecer isso na medida certa. Há muitos locais pra ficar, mas sem excessos. Há muitos restaurantes, concentrados quase no mesmo lugar. Há muitas praias, mas nem todas têm acesso fácil e é preciso fazer caminhadas de até 40 minutos para chegar. Assim, a cidade vai crescendo como destino turístico, sem perder o clima local.


(Belezas baianas)
A verdadeira jóia

De nada adiantaria se a cidade fosse tranquila demais e bonita de menos. Mas Itacaré ganha seus fãs ainda na estrada, que corta uma vegetação quase intocada de Mata Atlântica. Em todo o Brasil restam 5% desse tipo de vegetação, e parte dele está nesse pedaço da Bahia. A área entre Itacaré e Serra Grande é uma Área de Proteção Ambiental e foi considerada Reserva da Biosfera da Mata Atlântica pela Unesco. São 22 mil hectares de puro delírio (em zona) tropical.

E as estradas levam às praias, de água azul, areia branca e coqueiros verdes. Esses, a propósito, seguem o caminho contrário da Mata Atlântica pois estão lá substituindo a vegetação nativa. Antes, o espaço era ocupado por milhares de árvores de pau-brasil, que foram inteiramente exploradas pelos portugueses. Então os coqueiros (que nem brasileiros são, mas asiáticos) ganharam a paisagem.



(Surf em Tiririca e tranquilidade em Itacarazinho. As palavras poderiam ser ao contrário que - pelo menos nessa época do ano - não fariam diferença alguma)






É assim nas praias de Concha, Resende, Tiririca e Ribeira. Uma ao lado da outra, essas quatro praias formam um dos ambientes mais gostosos de Itacaré. O lugar tem poucas barracas de praia, muitas cangas coloridas na areia e uma galera tranquila e alternativa. Com boas ondas, as praias ficam cheias de surfistas. No final da tarde, na praia do Resende, quem quiser está convidado a fazer uma aula de capoeira, que atrai crianças, jovens, adultos, brasileiros e estrangeiros.

Os coqueiros também invadem as praias mais distantes ou de difícil acesso, como é o caso de Itacarezinho e Jeribucaçu. Na lista das mais bonitas praias da região, ambas são de difícil acesso. A primeira tem estrada, mas para entrar com carro os donos das terras cobram 10 reais. Já a segunda, nem de carro.

(As águas do rio Jeribucaçu encontram o mar na praia de mesmo nome. Foto tirada desse link)

Baladinha noturna

Pra completar, a vila de Itacaré é uma graça. Pequena que só ela, tudo está concentrado em um único lugar. Uma única rua, mais precisamente: Pedro Longo. Com lojinhas de ponta a ponta, traz padaria, mercado, tapioca, roupa de surf, aluguel de prancha e uma autêntica baiana, que vende acarajé e cocada na praça cental.

Hoje, a paisagem é outra. Há 10 anos, as opções eram poucas. Em 1998, porém, o governo construiu a estrada Ilhéus-Itacaré, que facilitou o acesso à cidade e aguçou a curiosidade do turista. O comércio percebeu rapidinho que o fluxo de pessoas estava aumentando e construiu, na mesma proporção, lojas, bares e pousadas. Tem hora que a coisa fica meio desorganizada: muitas placas, propagandas, varandinhas de madeira. Mas o clima é ótimo.


(A rua Pedro Longo durante a noite. Foto tirada desse link)

E começa a esquentar às 21h, quando o forró começa em alguns locais. Em termos de festa, o ritmo nordestino tem oferta e demanda na medida. Quem quer menos continua nos barzinhos. Quem quer mais pode procurar se informar sobre as raves e festas eletrônicas que acontecem na cidade - algumas com transporte gratuito.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Devagar quase parando

Antes de começar a falar sobre as cidades da Costa do Cacau, é preciso lembrar que uma das melhores coisas de estar na praia é não ter pressa. Estar na praia e na Bahia então é certeza de tempo mole. Quer exemplos?

O avião pousou em Ilhéus. O comandante tinha avisado que naquele dia fazia 30 graus. O bafo quente que subia da pista de voo, porém, queria me convencer a todo custo que fazia 35 ou até 40. Ah, a Bahia. Pedimos a primeira água de coco ainda no aeroporto, para refrescar. 5 minutos. Pense em 5 minutos para fazer isso: não é pouco. Principalmente se você está com sede.

Paramos no PONTO de táxi do AEROPORTO. Só tinham dois veículos disponíveis e já estavam ocupados. Quinze minutos para que algum chegasse. Almoço a beira da praia dos milionários, acostumada a receber turistas. Uma hora para ficar pronto. Mais? Em uma lojinha do centro, o moço demorou 20 minutos para tirar xerox de 40 páginas.

(A imagem veio desse link, com a legenda: Como diz a piada popular, a Bahia tem três ritmos: o lento, o muito lento e o Dorival Caymmi - um tempo devagar quase parando)

Eu odeio clichês. Essa coisa de tal povo é sem educação ou aquela cidade é uma simpatia são sempre questionáveis. Principalmente quando tratamos de pessoas, sempre mutáveis. Mas os clichês também não surgem por acaso... Nem me lembrava da fama e, mesmo assim, em pouco tempo pude confirmar que o baiano é devagar.

Não conheço toda a Bahia então também não vou generalizar. Já fui à Costa do Descobrimento e achei o ritmo normal. Até o momento, o vagareza é na Costa do Cacau. Foi um baiano da região, dono de um restaurante, trabalhador (e nem um pouco “devagar”, nos lembremos das exceções), que confirmou a teoria. Ele mesmo disse que, ali, as pessoas são mais lentas, que não sabem mexer com negócios. “Se vem cliente atrasado, não abrem as portas, se é difícil, vão deixando pra depois. Um dia mesmo eu liguei precisando de um tipo de peixe pra um grupo que me ligou em cima da hora e eles disseram sem ouvir os detalhes que só na semana que vem”.

(Em baixa temporada então, as barracas ficam vazias. E ótimas. Mas o serviço demora)

Origens

A região sempre foi rica. Primeiro o pau-brasil, depois a cana-de-açucar e, em seguida, o cacau, que trouxe grandes fortunas. Como contei no post passado, as condições climáticas eram perfeitas e durante os séculos XIX e XX a prosperidade era palavra de ordem. Fazendas enormes foram construídas, milhões de quilos de cacau foram colhidos e uma quantia enorme de dinheiro chegou à região.

Em 1985, porém, um fungo conhecido como vassoura de bruxa destruiu os cacaueiros e seus frutos. Um povo que foi criado na fartura e na riqueza precisou encontrar outras formas de sobreviver. Comércio, indústria ou turismo. A vida mansa (que não quer dizer fácil) ficou rápida. E com o amargo da perda.

E qual é o problema, afinal?

Ser lento pode ser ruim pra mim, urbana, acostumada com agilidade. Achamos que poupando 5 minutos aqui ou 5 minutos ali teremos uma hora a mais de descanso no fim do dia. Oi? Eu nunca encontrei esse tempo. Quem fica mais relaxado também não ganha horas de folga, mas aproveita bem melhor os minutos de descanso, sem a pressão de transformá-los em vida útil.

(Calor, vento, beleza e coco fresco. Pra quê a pressa?)

Isso não é uma desculpa para o mau funcionamento comercial. Servir uma água de coco em cinco minutos é demorado e pode destruir o humor de um executivo atrasado pra reunião. Mas esse jamais será um cliente. Então porque nos sentimos como executivos atrasados há todo momento? Na fala devagar e descompromissada do baiano (que eu, particularmente, adoro) já sentimos um desejo de diminuir o ritmo.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

As ruínas dos herdeiros do cacau

A Costa do Cacau traz uma paisagem recorrente que mistura abandono e esperança. para entender o que se passa na região basta ler um pouco sobre sua história e depois dar uma voltinha pelas estradas que mais se afastam das praias. Se você olhar atentamente vai ver, entre um campo e outro, casas coloniais com telhados de metal em cima. Algumas ainda conservam suas cores. Normalmente são brancas com janelas azuis. Outras estão caindo aos pedaços.

(Na estrada de Uruçuca. Elas apareciam de 10 em 10 km, no máximo)

Essas casas são as antigas fazendas de cacau. E foi com esse fruto que a região tornou-se rica. A hstória conta que em 1746, o colono francês Louis Frederic Warneaux plantou na capitania de São Jorge de Ilhéus (atual Ilhéus) as primeiras sementes do fruto, vindos do estado do Pará. As condições climáticas da região eram perfeitas para o cacau, que precisa de calor, água e sombra. Assim, enquanto a Bahia como um todo vivia dos latifundios de cana-de-açucar, a futura Costa do Cacau criou seu diferencial e cresceu economicamente.

E duas coisas contribuíram com isso. A primeira é o fato de a cana não ter vingado nessa área, o que fez com que a Mata Atlântica local ficasse preservada e pudesse fornecer sombra aos cacaueiros. A segunda está relacionada a origem pobre dos seus habitantes. Uma enorme seca no sertão nordestino levou à migração de muitas pessoas ao sul da Bahia, que se acomodavam em pequenas terras. A cultura do cacau nunca demandou grandes terras e com pouco espaço a produtividade já era grande.

(A Mata Atlântica foi fundamental aos cacaueiros e, hoje, eles são fundamentais à preservação do bioma. Imagem da ponte Lomanto Júnior, em Ilhéus)

Assim, como alguns produtores mesmo nos disseram, qualquer um que chegava, escolhia uma peqeuna terra, montava sua casa e os mecanismos necessários ao cultivo do fruto e pronto: ficava rico. Sobe desce Em 1860, quando a Europa e os Estados Unidos elevaram o cacau ao posto de objeto de desejo, a produção nacional se fortaleceu e voltou-se para a exportação. Até 1920 a Bahia viveu seu momento de maior apogeu e o Brasil tornou-se o maior exportador mundial do fruto. A riqueza também trouxe disputas: é dessa época as brigas de poder entre os coronéis. A violência era usada sem culpa para expandir os negócios.

(Fruto normal de um lado (ainda verde) e fruto com a vassoura de bruxa do outro. A coisa é tão fácil de passar que ao tocar uma fruta boa depois de ter encostado em uma fruta infectada, morrem as duas)

Depois, alguns períodos de baixa produtividade e de diminuição no valor do cacau no mercado internacional foram diminuindo a força do estado como exportador, mas a Bahia permanecia forte, cultivando seu ouro. Foi em 1985 que a produção cacaueira no Brasil realmente se viu falida: os fazendeiros dizem que foi por volta desse ao que chegou a vassoura de bruxa, fungo que ataca o cacau.

A vassoura é endêmica da região amazônica há algumas teorias sobre como ela chegou à Bahia. Alguns dizem que ela veio com o fluxo de fazendeiros de outras regiões. Porém, a teoria mais provável é a de que políticos e agricultores infectaram algumas árvore da Costa do Cacau por vingança. As plantas da Amazônia são resistentes ao fungo, mas na Bahia a minoria conseguiu sobreviver e a vassoura se espalhou pela região. Depois de infectado, o fruto dura cerca de uma semana até ficar todo preto e estragar.

No início, 90% da produção se perdia. Os fazedeiros gastaram verdadeiros ribeirões de dinheiro tentando contratando pessoas para remover os frutos podres e investindo em diferentes espécies. Mas se o vizinho não fizesse o mesmo as medidas não iam pra frente. A coisa só começou a melhorar no início dos anos 2000, com investimentos em enxertia, processo que consiste em misturar espécies comuns à resistentes. Hoje, cerca de 40% da produção é perdida.

(Enxertia: o ramo da espécie resistente é plantado junto à espécie infectada)

Vai dar tudo certo

Normalmente, escutamos pessoas muito velhas falarem de uma época distante que não volta mais. Quando essa época é distante mesmo, nem temos mais pessoas para contar. Nos restam livros, filmes, fotos, artigos de jornais. Nesse caso, o mais impressionante é ouvir esses casos de pessoas novas, de 40 ou 50 anos. O declínio do cacau é recente, tem pouco mais de 20 anos. E nesse pequeno período já fez tanto estrago.

Todos que viveram os "bons momentos" têm características em comum. Na fala, a tristeza e a saudade de um tempo de riquezas. No discurso, a indignação com aqueles que plantaram a vassoura de bruxa numa terra próspera. Nos olhos, a esperança. Uma grande porcentagem de fazendeiros não vendeu suas casas. Todos acreditam na recuperação da Costa do Cacau, seja pela continuação da cultura de enxertia seja pela via do cacau transgênico.

(A fazenda Independência recebeu propostas milionárias. Diminuíram o número de trabalhadores de 60 para 3 e chegaram a parar a produção por um tempo, mas não venderam a residência. Na foto, as barcaças onde o cacau fica secando)

Enquanto isso a área tenta se reerguer de todo jeito. Hoje, a Costa do Cacau é uma região que investe em turismo, indústria e serviços, mas que ainda cultiva a colonial (mas eficiente) forma de fazer dinheiro: plantando, colhendo e vendendo o fruto do cacaueiro.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Notícias estrangeiras

A cada semestre fico carente. Tudo começou bem, em 2006, quando um amigo foi para a Alemanha. Ok. Em 2007 outro, para os Estados Unidos. Em 2008, mais um: França. Mas a partir de 2009 a coisa começou a complicar e de seis em seis meses fico com cerca de sete pessoas em stand by, um pra cada canto do mundo. Ainda bem que algumas delas fazem blogs!

O Nott(ingham) at All, da Taís Ahouagi, traz suas experiências e impressões sobre as "terras de Robin Hood". O blog começou em janeiro e já tem uma série de posts com dicas de intercâmbio. Da busca pela casa perfeita até as loucuras do futebol saxão.

(A coreografia das cheerleaders não chegou ao pé do sujeito que apareceu correndo pelado pelo campo. Esse sim, fez a torcida vibrar)

O Sté Viajando renasceu no final de fevereiro. A Stéphanie Bollmann criou o blog em 2008 para escrever sobre sua viagem aos Estados Unidos. Agora de intercâmbio para Curitiba, ela colocou ele na ativa outra vez. A ideia é deixar a família e os amigos informados através de boas histórias!

O Loco por ti, America é novo em folha. Sâmia Bechelane (só nome complicado, eu sei...) acaba de aterrisar em solos argentinos e promete um semestre de boas notícias. O primeiro post foi "ao ar" ainda ontem. E me matou com uma foto de dar água na boca...

(Quer sorvete de primeira? G. Beltrano é o nome da cidade. Inveja...)

Recomendo a leitura! Esses e outros blogs estão linkados a esquerda, na seção "Minha lista de blogs", que tento atualizar a medida que sites bacanas vão surgindo na web.

P.S.: post novo só na semana que vem. Estou na Bahia trabalhando e aproveitando para juntar informações e fotos para postar aqui. Posso adiantar que o calor está de matar, Jorge Amado é o cara, a natureza do Brasil é realmente exuberante e as diferença culturais são a alma (ou a destruição) do negócio!

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Reconstrução (quase) total

Quem passeia pelas ruas de Munique observando sua beleza, seus prédios e monumentos, jamais pensaria que metade da cidade foi destruída durante a Segunda Grande Guerra.

(Até os símbolos da cidade - ou, principalmente eles - foram "vítimas" das disputas. Aqui, torres da catedral de Nossa Senhora de Munique)

A guerra praticamente começou na cidade: em setembro de 1938 foi convocada uma conferência com o nazista Adolf Hitler e diversas lideranças para discutir a anexação dos Sudestos, região da atual Tchécoslováquia aonde existiam minorias germânicas, ao território alemão. A pressão foi tanta que ingleses e franceses, com medo da iminente guerra, cederam. Essa seria a última reunião que tentou estabelecer a paz entre os povos. Depois, o governo alemão continuou anexando outros territórios e aumentando a insatisfação entre os países europeus. A guerra estoura um ano depois, em setembro de 1939.

A cidade foi alvo de diversos ataques. Muitas pessoas morreram com bombardeios a bares, casas e dependências públicas. Se você reparar bem, ainda é possível ver as marcas da guerra. Na foto abaixo, há um prédio todo rebuscado, cheio de detalhes. Ao lado, um edifício comum, sem muitos enfeites. Possivelmente, esse prédio rosa já foi como o amarelo, mas ficou sem suas características originais depois de algum ataque.

(A cidade está cheia de exemplos como esse. Foto tirada desse link)

A ideia do secretário de obras, Karl Meitinger, era preservar os monumentos históricos e suas fachadas medievais mas também modernizar Munique, na medida em que a população e a própria cidade pediam ruas mais largas, transporte público eficiente, priorização do pedestres em algumas vias, entre outros.

A lista de monumentos que sofreram bombardeios também é grande. A antiga Câmara Municipal, por exemplo, foi totalmente destruída. Depois da guerra, o governo tratou de se mobilizar rapidamente para reconstruí-la, dando-lhe o mesmo aspecto de quado ele era a porta de entrada da cidade. A Peterskirche, igreja de São Pedro, precisou de 10 anos para ser totalmente restaurada. A Residenz também sofreu ataques, mas teve uma rápida intervenção.

(Câmara Municipal. Tipicamente alemã)

O que espanta, além da forma como a cidade se restabeleceu, é a rapidez com que isso foi feito. A maior parte dos monumentos foi reconstruído com até 30 anos, efeito da vontade política de apagar a destruíção causada pela guerra e, ao mesmo tempo, respeitar os sentimentos das pessoas que perderam casas e familiares. Poucas foram os monumentos que demoraram para ser restauradas, como a catedral de Nossa Senhora de Munique. Suas reconstrução começou logo depois da guerra e foi feita em etapas. A última terminou ainda em 1994.

Munique também ganhou novos edifícios. É o caso da Neue Pinakothek, um prédio em forma de 8 (talvez uma forma de simbolizar o infinito) construído entre os anos de 1975 e 1981. Os gastos foram de 50 milhões de euros, tornando-se o maior museu alemão construído no pós-guerra. No acervo, as obras vão das pinturas clássicas até os impressionistas, com nomes de artistas renomados como Claude Monet.