segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Cidade milenar

Os nomes das mais famosas todo mundo sabe: Paris, Toulouse, Lyon, Bordeaux... mas diz aí quem ja ouviu falar de Clermont-Ferrand (e sem ser por minha causa)? Apesar de aparecer pouco, é uma importante cidade. Se levarmos em conta que a França tem lá centenas e centenas de cidades, Clermont chega a surpreender:

- É a 23 maior cidade da França, com cerca de 150 mil habitantes.
- É a 17 maior área urbana do país.
- Abriga a sede da multinacional Michelin (que influenciou fortemente o desenvolvimento local desde sua inauguração, nos anos 1910).
- Ocupa o 16 lugar no ranking nacional de ensino superior do país e abriga 35 mil estudantes, sendo 13 são estrangeiros.

Já dá pra começar a gostar da cidade assim, não? Mas o mais interessante ainda é o fato de a cidade ser milenar: Clermont-Ferrand existe há cerca de 2 mil anos. Para mim, que moro em uma cidade que não tem nem 120, é surreal.

(Um dos primeiros indícios da idade local: Temple de Mercure no alto do Puy-de-Dome. Foto tirada desse link)

Clermont é mencionada pela primeira vez pelo nome Nemossos, um termo gaulês que quer dizer "floresta sagrada". Durante o império romano, Clermont tinha uma população estimada em 15 a 30 mil habitantes, sendo uma das maiores cidades da Galia Romana. Com o fim do império romano, Clermont entra em um momento de trevas e tem seu território invadido por diversos povos gauleses.

En 848 a cidade ganha o nome de Clairmont, em referência a um forte chamado Clarus Mons. Alguns povos lutaram pelo domínio da cidade, nao só político como também religioso. No século X, uma consagrada catedral romana é destruída por alguns exércitos. No lugar, foi construída a catedral de Notre-Dame-de-l'Assomption. Símbolo da cidade, a catedral de estilo gótico foi feita com uma pedra vulcânica largamente utilizada na região e que dá às construções essa cor preta característica.
















(Bonita por dentro e por fora)

A igreja tem uma longa história de vida. Não por menos, sua construção começou em 1248 e só terminou em 1884. Entre os mais de 600 anos de obras, diversos artistas tornaram-se responsáveis pelo local. Além disso, revoltas e guerras destruíram partes da Catedral, o que obrigou os trabalhadores a começarem de novo.

Devido aos seus 50 metros de altura e 108 metros em cada torre, a igreja é o destaque da cidade pode ser vista praticamente de qualquer lugar. Logo ao lado da Catedral, na praça da Vitória, há uma estátua do papa Urbano II, responsável pela primeira Cruzada cristã de que se tem notícia.

(A primeira Cruzada tinha como objetivo deixar a passagem para Jerusalém livre para os cristãos. Mas há controvérsias...)

A essa altura, Clermont era a vila episcopal. Ao seu lado, os condes de Auvergne fundaram a cidade de Montferrand que foi, durante toda a época medieval, a vila dos condes. A união entre as duas vilas demorou um bocado para acontecer, pois tinham uma população e uma cultura muito diferentes. A junção das vilas só foi confirmada em 1731 por Luis XV.

No próximo post conto mais sobre os monumentos e museus da cidade!

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Subindo o Puy-de-Dôme

Se tem uma coisa que Clermont-Ferrand tem de sobra é vulcão. Não que aqui tenha um vulcão por pessoa, mas vá lá: para uma cidade com 150 mil habitantes, bastava um. E aqui tem uns 10 vulcões adormecidos. O mais famoso deles é o Puy-de-Dôme que, inclusive, deu seu nome para a região, o departamento de Puy-de-Dôme.

(Lá em cima, o topo do Puy-de-Dôme. Foto tirada desse link)

Esse vulcão adormecido há mais de 12 mil anos tem 1465 metros de altitude. Ele é fruto de duas erupções sucessivas em um espaço de poucas centenas de anos. O Puy-de-Dôme está bem afastado do centro de Clermont-Ferrand. Para chegar até lá é preciso ir de carro, ônibus ou trem. Em compensação, para chegar ao topo do vulcão só há uma forma possível: a pé.

Foi a faculdade que organizou o passeio, na terça-feira passada. Todos os alunos estrangeiros foram convidados para subir até o topo do Puy-de-Dôme. Saímos da faculdade de ônibus e chegamos ao parque em 30 minutos. Lá, nos sentamos para o almoço: uma baguete, um pedaço de bolo de chocolate e uma garrafa d'água (nada mais francês).

(Frango, queijo, tomate, alface e molho de maionese. Dá pra entender porque os franceses adoram "pular" o almoço para comer uma baguete)

A subida começou no início da tarde. O tempo médio de subida é de 45 minutos. Nosso guia nos disse que todo ano há uma disputa aberta ao público para ver quem sobe o Puy-de-Dôme em menos tempo, o Trophée de Muletiers (algo como "o troféu das mulas", nome do caminho que leva ao topo do vulcão). O recorde é do corredor jean-Cristophe Dupont, que fez todo o trajeto em 11 minutos e 8 segundos. Levando em conta a areia escorregadia do caminho e os quase 2500 metros de trajeto no sol, posso afirmar com toda certeza que ele foi muito rápido.

Nós demoramos quase uma hora. Um monte de gente nos passou, incluindo pais com crianças de colo e velinhos da terceira da idade. Mas a gente estava sem pressa nenhuma. A cada bela paisagem que se abria lá do alto (e são muitas) a gente parava para olhar ou tirar uma foto.

(Não há idade para subir o Puy-de-Dôme)

Já no meio da subida é possível ver a sequência de vulcões da região, conhecida como Chaîne de Puys. Para mim, que o mais perto que eu já cheguei de um vulcão foi a cidade de Poços de Caldas (já tão desenvolvida que você nem notaria que aquilo está dentro de um vulcão se não te falassem), é uma imagem de tirar o fôlego.

(Uma paisagem fora de série para nós, brasileiros. Até então, eu só tinha visto vulcões pela TV)

Quando cheguei ao topo do Puy-de-Dôme tive outra surpresa. Lá em cima, resquícios de um templo construído nos séculos I e II pelos Gallo-Romains, povo originário da civilização celta que habitava uma parte do território gaulês. A construção, dedicada ao deus Mercúrio, foi abandonada no século II ou IV e redescoberta só em 1873, na época da construção de um observatório atmosférico.

O Laboratório de Metereologia de Montanha e a imensa antena de TV, no topo do vulcão, também são construções interessantes. É possível ver o Puy-de-Dôme de qualquer ponto de Clermont-Ferrand e o formato dessas construções lembra uma grande nave espacial pronta a ir para o espaço.

(A esquerda, as ruínas do Templo de Mércurio. Ao centro, a Nasa entra em ação)

O Puy-de-Dôme é um dos pontos turísticos mais visados da região de Auvergne, com mais de meio milhão de visitantes por ano. O local também é muito frequentado pelos adeptos do parapente e da asa-delta, tanto pelo visual quanto pelas boas condições metereológicas para vôo. Em 2008, o governo da região aprovou a construção de um caminho de ferro até o topo do vulcão. A conclusão do projeto está prevista para 19 de junho de 2010, data de nascimento do físico Blaise Pascal, nascido em Clermont Ferrand. A ideia é possibilitar que portadores de necessidade especiais e outras pessoas também possam visitar o local. Mas que fique claro: a visita a pé ainda vale a pena!

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Em detalhes

Detalhes, histórias e lugarzinhos que fazem de Vichy uma cidade memorável (e não apenas pelos cosméticos milagrosos!)
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(A cúpula de um dos estabelecimentos de tratamento com águas termais)

(Uma das estações de águas termais de Vichy, no Parc des Sources. Para pegar um pouco de água é preciso de receita médica)

(Luxuosos hotéis. Cores calmas e sacadas em ferro fazem a graça dos prédios da cidade)

(O caminho coberto do Parc les Sources que mais parece cenário de filme dos anos 20)

domingo, 12 de setembro de 2010

Agradável Vichy

Na hora em que pensamos em Vichy, uma de nós já soltou: "lá é a terra dos cremes. Vou comprar um monte de Vichy pra usar. Quem sabe dá pra levar pro Brasil e vender mais caro também?". E foi assim que começou a proposta da nossa primeira viagem pela França. Por sorte, percebemos logo de cara que a pequena cidade francesa era muito mais do que seus cosméticos.

Vichy (pronuncia-se Vi-chí), está a 50 km de Clermont-Ferrand e tem cerca de 25 mil habitantes. O turismo local é voltado principalmente para o uso terapéutico ou estético das suas águas termais. De Vichy brotam fontes de águas termais ricas em bicarbonato de sódio e gás carbônico, que ajudam no tratamento de problemas de fígado, vesículas, estômago, pâncreas e intestinos. Suas águas (e seus benefícios) já eram conhecidos desde 52 a. C., o que fez a cidade prosperar economicamente e em grande velocidade.

(A cidade é cheia de grandes e luxuosos hotéis que recebem pessoas do mundo inteiro, principalmente por causa das suas águas termais)

Durante a Segunda Grande Guerra, entre os anos de 1940 e 1944, o governo francês se mudou para a cidade e ela se tornou a capital da França. A escolha de Vichy como sede do governo francês deu-se por diversos fatores, entre eles a proximidade com Paris e a grande capacidade hoteleira local.

Dá pra perceber que a cidade sempre foi chique! Além dos caríssimos tratamentos termais, a cidade conta com um imenso campo de golfe de 5 km no meio da floresta, um Hipódromo, um Casino e diversas galerias de arte e roupas de marca. Só coisa de gente rica ne? Nós, quatro estudantes brasileiras que ainda não conseguimos parar de ficar convertendo euros para reais a cada compra, aproveitamos Vichy de um outro jeito.

Feita de casas e parques

A passagem de trem para Vichy era bem barata. Na França, quem tem entre 18 e 25 anos pode fazer uma carta para conseguir descontos em passagens de trem. A carta custa 50 euros e vale até você passar dos 25. Com ela, a passagem custou 4,80. Sem ela 7,20. Barata, de toda forma.

Saímos de Clermont às 8h30 e em trinta minutos chegamos ao nosso destino. Como já disse, nada na França parece começar antes das 10h, então a cidade ainda estava um pouco parada. Passamos pelo chiquérrimo Hotel de Ville, que hoje é a prefeitura da cidade. O local foi construído em 1925 em estilo neo-renascentista. Uns passos a mais e estávamos na Place Charles de Gaulle, uma praça um tanto quanto movimentada para aquela hora do dia. Entramos em uma padaria/confeitaria e ninguém foi capaz de recusar seus quitutes.

(Já deu pra perceber que esse é o meu mal ne? Vou postar fotos dessas delícias açucaradas em quase todos os post...)

Depois do lanchinho, fomos até a Avenue Du, a avenida mais comercial da cidade. Paramos em uma farmácia e começou a sessão de beleza da linha de produtos Vichy. Durante todo o passeio não vimos nada de mais em relação à marca de cosméticos. Não sabemos se é na cidade que os produtos são produzidos ou se eles usam as famosas águas do local para isso. De toda forma, eles são muito baratos. Um pote de creme hidratante por 9 euros, enquanto no Brasil custaria mais de 70 reais e por aí vai. Sou um homem em relação a essas coisas: não compro hidratantes e tenho preguiça de usar, mas garanto que as meninas fizeram a festa!


(A Avenue Du e as Passages, ruazinhas transversais exclusivas para pedestres que guardam lojas de roupas, sapatos e toda espécie de coisas. A cidade tem várias delas)


Já na loja de doces, fui eu a primeira a entrar. Vichy também é famosa por suas pastilhas. Produzida com as águas termais da cidade e a partir de uma série de condições físico-químicas, elas eram quase um remédio para os oradores na época de sua criação. Depois, aos doceiros da região também começaram a produzir balas de diversas espécies. Compramos alguns potinhos de 1 euro e trocamos os sabores.

No meio da Avenida entramos na igreja de Saint Louis, construída de 1861 a 1865 a pedido de Napoleão III, o mais ilustre morador da região e incentivador do seu desenvolvimentos. Os nove vitrais na nave da igreja representam os santos da família imperial. O local é bonito, mas devo admitir que a própria Catedral de Clermont é infinitamente mais bonita e encantadora.

(Igreja de Saint Louis)

Depois fomos ao Parque des Sources, ou parque das fontes. Uma coisa interessante de Vichy é quantidade de área verde. A cidade já recebeu diversos prêmios nacionais de patrimônio natural devido as suas diversas espécies de árvores e flores. Os parques circundam praticamente toda a margem do grande lago de Allier, o principal da cidade. Eles são dotados de playground, mesas de ping pong, quadras ára esportes, campos de mini golfe e uma série de atrações para todas as idades. No verão eles viram o grande point da cidade e até uma "praia" é instalado no local.

(Essa é a ponte que atravessa a cidade. A tarde, sentamos em um desses parques para aproveitar o pôr do sol. Demos sorte também: o único quiosque aberto ia fechar aquele dia por causa do fim da temporada de verão e estava vendendo qualquer sorvete por 1 euro!)

O Parque de Sources é o único longe das margens do Rio. Ele foi construído em 1812 a mando de Napoleão I e está no bairro mais antigo da cidade. Ao seu redor estão todos os divertimentos da cidade. O parque tem esse nome por guardar algumas das mais importantes fontes da cidade. Ao seu redor há uma linda galeria coberta em ferro que foi construída para facilitar o trânsito das pessoas entre as fontes e as termas.

Ali perto estava uma estranha construção: duas igrejas completamente diferentes, mas uma do lado da outra, unidas entre si. Uma delas é do século XV, se chama Eglise Saint-Blaise e ficou famosa por ter atendido a diversos milagres já nos anos 1900. A outra é exatamente do século XIX e foi construída com o intuito de aumentar a primeira. Ela se chama Notre-Dâme-des-Malades e guarda um estilo art-déco.

(Então fomos para o Parc des Sources escutar o Le Quartet Steamin, que estava se apresentado todas as manhãs de setembro por lá. Eles tocam Swing, Be pop, Jazz, Bossa Nova, mas de animado não tinha quase nada...)

Depois visitamos a Ópera e o cassino da cidade. Não dava para entrar nos lugares, pois eles estavam sendo arrumados para abrigarem eventos diversos naquela noite. De fora o lugar já era enorme e muito bonito. O mais engraçado dessas cidades é imaginar como elas funcionavam nos seus anos aúreos, no século XIX, quando homens e mulheres vestiam suas melhores roupas para assistir a peças de teatro e musicais.

O almoço foi tranquilo. Encontramos um restaurante pequeno que servia comida boa e rápida. O lugar se chama Le 104. As meninas pediram massa e eu uma salada. Cada porção ficou por 5,50 euros. O próximo lerê do dia seria dar a volta na cidade de trenzinho. Porque, vocês se perguntam. É fácil: Já tinhamos andado muuuito mas, mesmo assim, não conseguiriamos ir a certos lugares a pé se quisessemos andar com calma e aproveitar a cidade. O trem nos levaria nesses locais, além de ter um audio-guia que contava a história das cidades e dos seus pontos turísticos.

(A esquerda, o trenzinho La Mouette II. A direita, uma casinha em estilo inglês)

Era um pouco salgada - 6 euros o passe adulto - mas valeu a pena. Entre as atrações pelas quais passamos estavam o Castelo Franco, construído ainda no século XV e redecorado em estilo néo-gótico, a fonte de águas de Celestin e em diversas ruas residenciais famosas pelos suas construções arquitetônicas, de inspiração colonial, inglesa ou suiça. Depois dos parques, essa foi a outra coisa que mais me chamou atenção na cidade: suas lindas casinhas de sacadas trabalhadas em ferro. Dá vontade de morar em uma delas. Também fomos à borda do rio Aillers, conseguimos ver o Hipódromo e o campo de golfe do outro lado da margem.

Ao fim do passeio de trenzinho, fomos à Les Boutiques du Forum, uma galeria com lojas de arte e souvenirs turísticos. Com todos os "lerês" compridos, voltamos àquela rua movimentada e nos deparamos com um grupo de danças folclóricas e históricas da França!

(A gente conversou nesse mesmo dia sobre como não conhecíamos nada que fosse típico da França em termos de música)

Depois de ver o sol cair às margens do Rio d'Allier, voltamos a área central da cidade e sentamos em um barzinho para esperar o nosso trem, que só ia partir às 22h20. Como qualquer cidade francesa (pelo menos até agora) desde às 20h tudo já estava fechado. No bar só tinha nós 4 e mais um outro casal, que não se demorou. Jogamos conversa fora até anoitecer e voltamos felizes. Perguntamos para o pessoal aqui da moradia se eles conheciam a cidade e muitos disseram que não ou torceram a cara, falaram que era um lugar pequeno e que não tinha nada para fazer. Realmente, um dia foi o suficiente para considerar Vichy como um lugar encantador e não entediante.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Diferenças culturais

Os hábitos franceses me deixam cada dia mais curiosa. Adoro sentar no parque, ou mesmo no hall da minha moradia, para observar as pessoas. Eles não são tão diferentes assim de nós e, provavelmente, de todos os outros seres humanos do mundo. Todos gostamos de conversar, de andar em grupo, de escutar música, de ficar na internet...

Mas o que não é a cultura, não é mesmo? Há certos hábitos e atitudes que são simplesmente únicos. A primeira coisa que me chamou atenção foi o tom de voz, como disse no outro post. Os franceses falam baixo, seja no telefone, seja ao vivo. Claro que existem suas exceções. Adolescentes, por exemplo, são adolescentes em qualquer lugar do mundo, e eles falam alto. Mas, mesmo assim, não tanto quanto no Brasil. A regra também vale para bares e boates: algumas pessoas podem até elevar o tom de voz, mas o ambiente não fica chato ou insuportável.


(A loja Virgin é gigantesca. É uma Leitura Megastore mil vezes maior. E eles ainda vendem - muitos - discos de vinil. Sempre cheia de pessoas e músicas, o barulho é bastante suportável)

As pessoas aqui também parecem não ter pressa. Em Paris, capital, ou em Clermont-Ferrand, minha cidadela do interior, as pessoas não correm. Elas andam normalmente, como se estivessem passeando. Deve ter alguma coisa a ver com a eficiência do transporte público. Afinal, eles tem metro. É barato, rápido, e se você perder um não precisa esperar nem 10 minutos para pegar o outro. Além de não correr o risco de pegar engarrafamentos.

Pra comer é a mesma coisa: pressa nenhuma. Quase todos têm cerca de duas horas para almoçar. Sair do trabalho, ir a um restaurante ou em casa, sentar, esperar a comida, comer, conversar, voltar ao trabalho. Coisa que nós, brasileiros, fazemos em uma hora. Coisa que certas pessoas sequer fazem (pois pulam o almoço ou comem fast-food).


(O famoso Croque Monsieur, um grande misto quente, só que com queijo e pesunto do lado de fora. Até isso vem com uma saladinha)

E por falar em comida, como eles comem. Um prato de almoço tem entrada, prato principal e sobremesa. E um pãozinho pra acompnahar que ninguém é de ferro. Ainda assim, eles são magros. Não são magros esqueléticos, mas não se importam tanto com o peso como no Brasil. As pessoas comem sem pensar se aquilo tem 3 ou 300 calorias. A diferença está nas escolhas. Vou copiar aqui um típico menu francês para toda a semana:

SEGUNDA: Salada de beterrabas com croutons, couscous de cordeiro com legumes cozidos, iogurte e frutas da estação.

TERÇA: Salada de cenoura ralada com molho de limão, carne de porco ao molho de mostarda, ervilhas, queijo branco e frutas caramelizadas.

QUARTA: Alface com abacate, bife grelhado com feijão, nectarina e salada de frutas.

QUINTA: Salada de batatas, bife de peru ao molho de curry com vagem, queijo dos Pirineus e frutas da estação.

SEXTA: Salada de cenoura, xuxu e milho, bacalhau ao molho holandês, arroz com legumes, queijo camembert e creme de chocolate.

Tirei essa lista do livro Français, je vous haime. Agora, de onde vocês pensam que saiu essa lista: de um restaurante comum? Da sala de almoço dos funcionários de um museu? Do pessoal da Air France? Este é um menu de uma escola primária de Paris. No último dia do mês tem batatas fritas, só dois dias do mês não têm salada como entrada e doze dias da semana ofecerem frutas da estação como sobremesa. Como diz o autor, os franceses não precisam de ninguém para lehs dizer o que faz bem ára suas crianças. As pessoas criam o hábito de comer equilibradamente desde pequenas.

Deveríamos imitar os franceses em certos aspectos. Quer um exemplo? Os franceses adoram não trabalhar. Pela regulamentação nacional, o trabalhador deve pegar na labuta só 35 horas por semana. E ai do político que quiser aumentar. Segundo o livro que estou lendo, tudo é motivo para greve. E pelo visto Stephen Clarke está certo porque hoje a França está de greve pelos aposentados. Os restaurantes universitários, por exemplo, não vão funcionar a noite. O moço da recepção até brincou: "c'est pour travailler moins et gagner plus" (algo como, é para trabalhar menos e ganhar mais). As greves aqui são mais do que um direito dos trabalhadores, são quase institucionais.

(Pra quê trabalhar, afinal?)

De toda forma, o francês leva a sério o ditado de "eu não vivo para trabalhar, trabalho pra viver". As lojas abrem às 9h ou 10h e fecham às 19h. Isso inclui shoppings, supermercados e grande parte das lanchonetes. Os bares (e são poucos) ficam abertos até 1h da manhã. Domingo é o pior dia: as cidades parecem um cemitério. Nada abre.

Outra coisa interessante é como as pessoas se apropriam dos espaços públicos. Há pessoas às margens do Rio Sena de segunda a segunda. Elas correm, tocam instrumentos, jogam conversa fora. A noite é hora dos piqueniques e jantares a luz de velas. Acontecem até cursos de dança de salão. Essa regra de estende por todos os parques e praças. Seja em Paris, seja em Clermont.


(Crianças brincando em uma estátua de cabeça em Paris. O resto da praça estava cheio de pessoas, e era uma simples terça-feira)

(Pessoas nas margens do rio Sena. Se pelo menos o Arruda tivesse margem...)

sábado, 4 de setembro de 2010

A gentileza francesa

Estou triste pelos franceses terem fama de serem arrogantes e sem educação. No momento, inclusive, estou lendo um livro que se chama Français, je vous haime, uma piada com as palavras aimer (amar) e haine (ódio). O autor é Stephen Clarke, um inglês que passou grande parte da sua vida adulta na França e adora zuar com os hábitos e a tal "arrogância" francesa. Nesse livro, ele fala muito mal dos franceses, dá exemplos de como eles podem ser extremamente chatos e afirma que "os franceses sempre têm (ou acham quem têm) razão".


(Plena treça-feira, as pessoas lotam a praça de um bairro qualquer. Outro hábito do francês é o uso constantes dos espaços públicos)

Ainda não acabei de ler, mas o livro é uma piada e faz jus a todas aquelas ideias que temos sobre os franceses. A questão é que, sinceramente, os franceses são muito mais educados do que as pessoas dizem que são. Estou na França a uma semana e posso mudar de opinião, mas até agora não tive motivo nenhum para reclamar de um francês sequer. Levei uma patada de uma mulher que tinha uma loja na frente das Galerias Lafayette. Como não sabia falar lenço, ela não entendeu o que eu queria e gritou: quê que você quer? Mas grandes coisas, foi um único caso e os comerciantes no Brasil são iguais.

No mais, todos os garçons, vendedores, atendentes, professores e pessoas que tive contato até agora são ótimas. Gentileza talvez seja a palavra. As pessoas não reclamam muito, não se xingam muito e nem sequer falam alto. Elas falam em um tom normal. No metro, mesmo lotado, você não escuta risos escandalosos, gritos ou crianças berrando. Tanto que não dá pra escutar uma ou duas conversas em particular, você escuta um burburinho das pessoas que estão falando. Uma mulher que estava na minha frente no metro falava tão baixo que eu podia jurar que ela não estava conversando, só mexendo a boca.

Deve ser algo ligado a educação. Os pais educam as crianças desde cedo a serem quietas. Sempre que uma falava mais alto os pais faziam "Shhhh!". A única vez que vi um francês nervoso foi ontem, quando uma criança sem querer derrubou um copo de água no chão. Ele gritou e olhou pro menino com um rosto de ódio. Depois, o pegou pelo braço e saiu andando com raiva. O menino parecia apavorado, ele não soltou uma palavra sequer. Na mesa comentamos "credo, é só uma criança, acontece". Essa parece ser a diferença: não é que os franceses reprimam seus filho (bem, talvez sim), mas para eles não pode haver muitas falhas, nem choros os barulhos escandalosos. É uma educação mais rigorosa e começa desde cedo.

E viram adultos educados. Absolutamente TODOS os vendedores lhe dão "bonjour" quando você entra e "au revoir" quando você sai, e não parece que façam isso por obrigação. Até hoje, todas as pessoas que pedi alguma informação foram extremamente solícitas. Elas não só explicavam nos mínimos detalhes, falando calmamente, como chegavam a ir até o lugar para nos mostrar o caminho. Quando minha amiga saiu da estação de metro e quando chegou na moradia encontrou pessoas que a ajudaram a carregar a mala (uma grande mala) escada acima.

Fico triste pelos franceses... Enquanto isso, nós somos considerados o povo mais acolhedor de todos. Quando falamos que somos do Brasil as pessoas soltam um sorriso ou dão aquela "sambadinha". Mas poucos têm paciência para ajudar os outros.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Comer e beber em Paris

Em três anos de estudos de língua francesa no Brasil, o que mais escutei e aprendi foi sobre comida. Ok, a França é o país da gastronomia. Particularmente, eu acho esse título uma sacanagem, porque todo país tem suas especialidades. Assista a um só episódio daquelas séries aonde as pessoas viajam o mundo para comer e você vai ver que na Índia ou na Itália também existem mil pratos diferentes. Mas tudo bem, isso é uma questão histórica e, no caso da França, está mais ligado a "alta" gastronomia do que tudo. Afinal, aqui você encontra alguns dos melhores chefes e dos melhores pratos já criados pelo homem.

Mas é difícil participar tão ativamente da alta gastronomia se você não tem muito dinheiro. Então, como (e quanto) é comer e beber em Paris? Nunca li em nenhum lugar quanto se gasta comendo pela cidade luz. Esse post, então, é um pequeno guia sobre o assunto.

De forma geral, o café da manhã de um francês é composto por cereais, pão com queijo e/ou presunto, croissants, brioches, pequenos crepes recheados com geleia ou nutella, alguma fruta e uma bebida (leite, suco ou café). Tomei café da manhã no Ibis Paris Tour Eiffel. O preço por isso tudo eram incríveis 7,50 euros. A variedade compensa bastante o preço. As brasseries, ou padarias, abertas desde cedo vendem os quitutes separadamente. A maioria costuma oferecer um menu de café da manhã, como em um hotel.
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(Diz aí se não parecem deliciosos? Um croissant grande custa mais ou menos 2 euros)

No almoço, o garçom sempre leva pão para o cliente beliscar antes da comida chegar. E não precisa ficar com medo de comer pois é cortesia da casa. Outro costume francês é comer queijo depois das refeições. Há uma parte especial no cardápio para você escolher o queijo que vai pedir depois do prato, engraçado não? E a variedade de queijos é realmente surpreendente. É possível comer um queijo diferente a cada dia do ano e ainda não provar todas as variedades. Os mais comuns são o ementhal (aquele dos desenhos, cheio de buracos - muito usado nos mistos quentes), o gruyère e o brie. Esse último tem uma camada de mofo por fora, e não é o único. Há vários desses e parecem ser de bastante prestígio.
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Mas no almoço a coisa complica em vários aspectos. O primeiro é a forma de pedir. A comida vem sempre "empratada" em versões individuais. Individuais mesmo. Aqui não tem fartura. Essa de "é pra um mas comem dois", como acontece no Brasil ou em Portugal, não cola. E, infelizmente, o self-service ainda não chegou por aqui. Ou até chegou, mas não fez sucesso. A ideia é chegar ao restaurante e pedir o prato do dia, que é normalmente a opção mais barato dos restaurantes. Eles sempre deixam a opção de prato do dia e o preço a vista do cliente.
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Há também outras opções. Se você pedir o "menu" vai escolher direto no cardápio. Pode ser uma entrada + prato, ou prato + sobremesa, ou entrada + prato + sobremesa. Você pode dar a sorte de ir em um lugar e sair vazio, satisfeito ou empanturrado, mas vai pagar o mesmo em qualquer opção.
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(Restaurante Les Delices du Manom. A comida mais gostosa que comi por aqui... Nessa, o prato do meu pai: bife de pato com batatas)

O segundo problema inclusive, são os preços. Comer em Paris é muito caro. Para mim, que saí de Portugal então, nem se fala. Lá, o prato do dia super farto era de 4 a 6 euros. Aqui, um prato do dia com menos comida é de 10 a 2o euros. O menu fica ainda mais caro, de 13 a 25 euros. Há também os locais mais baratos e mais caros para se comer. Os arredores do Quartier-Latin, de Montmartre e do Les Halles são mais baratos. Os mais caros - como não deixaria de ser - são os restaurantes pertos de grandes pontos turísticos, como a Torre Eiffel o Arco do Triunfo, na Av. Champs-Elysées.

Os pratos franceses podem não ter nada de especial. Até então provei bife à Bourgnon, que tem um nome muito bonito mas não é nada mais nada menos que bife com um molho tipo madeira, e salmão com legumes. A graça do que eles fazem naõ é a carne, mas o molho. Até as saladas são deliciosas porque o molho deles é muito bom. Caviar, escargot e coxas de rã eu dispenso!

(O meu prato no Delices du Manom: salmão com legumes cortados a Juliana! Esse tipo é quando cortam os legumes bem fininhos. O molho era maravilhoso)


Escolher a bebida é quase uma arte. Um suco (e eles não têm sucos feitos na hora) custa cerca de 5 euros. Uma coca-cola, um ice tea ou um chocolate quente, cerca de 4 euros. Já um copo de vinho custa quanto? De 4 a 6 euros. A bebida é extremamente comum por aqui, seja no almoço ou no jantar. Agora, o mais estranho mesmo é a água. Uma água engarrafado de 350 ml custa cerca de 3,50 euros, o que é muito caro.
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Em compensação, se você pedir uma garrafa de água eles normalmente vão trazer uma garrafa de água de torneira. E gratuita! Para nós brasileiros é muito engraçado a água ser tão caro. Fui à Galeries Lafayette e comi um grande pedaço de torta folhado de frutas vermelhas por 5 euros, quase o mesmo preço da água.

E por falar em doce, a Europa está recheada deles. E são deliciosos. O chocolate, o sorvete, os biscoitos e todas as delícias açucaradas desse continente são ótimas. Isso porque o doce delesnão é tão doce quanto o nosso. Eles usam menos açucar e muito menos conservantes. Não é a toa que a única encomenda da minha mãe foi: "traga muuuito chocolate". Uma barra custa cerca de 1,50 euros (até convertendo pro real vale a pena).

(A máxima "também se come com os olhos" é levada a sério por aqui! Uma torta dessas custa cerca de 5 euros. Em Portugal seria uns 3 euros)

Posso ser fresca para comidas de sal, mas quando o assunto é doce a ideia é provar de tudo. Croissant com chocolate é ótimo e tinha todos os dias no café da manhã. O famoso Crème Brûlée (cerca de 6 euros) também é uma delícia: é um creme amarelo gelado que eles colocam açucar em cima e queimam com um maçarico, criando uma casquinha quente bem fininha.

Quanto aos "lerês" de marcas de doces também já fiz todas. Fui comer macarons na luxuosa Ladurée (é por peso e 8 unidades ficaram 9,50 euros) e tomar sorvete na Berthillon. Existem diversar lojas que vendem o sorvete por aí, mas a original fica na Ilha de São Luís e, por incrível que pareça, é mais barato que nas filiais. Uma minibola é 2 euros. É caro pela quantidade, mas o sorvete é muito. É aquela pequena extravagância que a gente faz, tipo comer um Magnum Cokies uma vez por mês.